quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Pós eleitoral


Temos passados por muitas e repentinas transições que nos obrigam a tomar determinados posicionamentos e deste modo, cumpre, para aqueles que tem nos acompanhado, aclarar os posicionamentos e porquês das travessias.

Como no mito da travessia do jacaré em que parte do povo ficou de um lado e o outro, do outro, as nossas também tem nos separados. Como no mito também, uma arara azul e amarela levava as mensagens de um lado ao outro do rio daquele povo que, no fundo, reconhecia-se como um só.
Bem lembrar que na Floresta tem a Kaná, arara azul, bem como tem a vermelha, Shawã.
No que refere a hoje, a travessia, é o posicionamento pós-eleitoral. Confirmada a esperada vitória de Bolsonaro, novas definições têm de ser feitas. Isso porque, é claro, a vitória de Bolsonaro era mais do que esperada. Vinha anunciada por setores que lhes fizeram oposição desde o início. Não gostaria de detalhar tantas coisas que para qualquer pessoa normal já seria visível e compreensível. De que Ciro venceria essa eleição, ou ao menos, teria maior chance de vencê-la é algo insofismável. Aqueles que nos dizem ‘agora não é hora de...’ são os mesmos que regem a batuta das esquerdas há bem mais de que 13 anos. Os mesmos hegemonistas de sempre são os que impõe novamente agira como as esquerdas devem pensar e agir em função, ao final, de seus próprios interesses.

Há a tendência disseminada em pare das esquerdas orgânicas, ou seja, para além das esquerdas partidárias, que tendem hoje a abraçar a resistência ao que virá contra o ambiente, as indústrias, o trabalhador, aos professores, e ao povo em geral como foco prioritário de ação. E eles estão certos.

Ocorre que no fim das contas, estes que agem como esquerda orgânica, estão também sob a batuta de algo que se pensa como um determinado centro produtor de verdade histórica mas também moral. 

Este é talvez o aspecto mais danoso do PT e da mentalidade petista. Há um que de conversão que se espera dos seus que dificultam muito mais a conversa como quem não o é e nem o precisa ser para assumir determinadas lutas e compromissos.

Nesse sentido, a figura de Ciro adquire muito mais a importância de um líder, não porque o seja ele em si, um centro produtor de verdade, mas justamente porque ele não o é. É pela possibilidade em aberto, de um polo político centrado em Ciro, que ele se torna uma importante opção eleitoral. A um polo em aberto, há muito o que agregar. Num polo fechado, não há nada mais a ser dito. Trocando em miúdos em termos eleitorais; para a população, um governo do PT ela já sabe o que vai ser, e ela não o quer. Isso está claro. Outras possibilidades estão abertas e elas representam outro segmento da população, justamente àqueles que em pesquisas rejeitariam Bolsonaro por Ciro, ou ainda mais verdadeiramente ainda àqueles que por forte rejeição tanto ao PT quanto à Bolsonaro, se negaram inclusive a mobilizar seu próprio voto. Estes foram 42 milhões de brasileiros.

Haveria muito mais a dizer, mas em tempos de tão pouco tempo, tanto vale mais poupar as palavras, mas se fosse encerrar por aqui meu texto seria por dizer, que não precisamos de ‘mimimi’ como nos dizem sobre o que fazer com nosso tempo. Dá muito bem para usar o tempo para fazer resistência e oposição ao governo Bolsonaro e ao mesmo tempo se opor ao hegemonismo petista.  Mas é claro que, em se havendo aquilo que há décadas é pedido pelos aliados do PT de que haja autocrítica, novas bases de relação podem ser construídas. Sem isso, não há nada a ser dito, e no extremo possível, ser derrotado diante de nossos inimigos, ainda é melhor opção do que ser traído por nossos supostos aliados, de quem aliás nunca perdeu nenhuma oportunidade de os trair.

O PCdoB já abriu o olho faz tempo, ainda que após tantos anos tenham se acostumado ao papel. PSB parece estar na pista. Que venha. Da mesma parte, continuamos nosso papel de resistência e oposição que é o que nos cabe. Mas ninguém vai ficar mais engolindo em seco às provocações. Ou seja, o ônus dessa vez, vai ser duplo. Cada facada de lá vai levar uma daqui, e se tivermos que ir sangrando os dois par vala, vamos.

O PSOL e os que os orbitam que se acautelem. O partido a bem dizer sofreu uma intervenção que mudou uma direção hostil ao PT e seu hegemonismo por outra mais lhe favorável. O resultado: os 0,7% de votos de Bolulos. Perder para o ex-filiado expulso, Dacciolo deve ter sido bastante constrangedor. Bem vindo ao deserto do real.
Boulos e o PSOL não conseguiram ser mais que um apêndice muito pequeno, mas que ampliou sua base no congresso. Uma boa base e aliás as melhores notícias vieram talvez destas vitórias. Uma vitória identitária, um plano político sobretudo de que Ciro parece querer secundarizar. Talvez ele esteja certo, não sei. Mas a falta de um projeto que pudesse falar a todos os brasileiros parece ter sido determinante para que uma parte significativa da população, mesmo sob os rótulos de minorias, ainda assim pudessem preferir se juntar as hostes do suposto ‘inimigo’. É o que é.

Adiante, nossas diferenças são muitas e que bom que são muitas, e deque penso na verdade de que aqueles que pensam em fazer sua parte e seu papel em rede e sem líderes definidos são entre os loucos, os mais certos. Mas ainda assim, toda essa militância pulsante, vibrante, permeável e indefinida estará em 2022, diante de uma nova transição cujas opções serão definidas por atores já em jogo há muitas partidas. Nesse sentido, é absolutamente salutar, que todo esse movimento tenha ao menos mais de que ter de escolher entre uma opção fascista e outra petista. Não que estejam no mesmo grau, mas temos de concordar: ambas opções são horríveis.
Que haja uma terceira. E que mesmo que estejamos em lados opostos do rio, que a arara azul não deixa de fazer voar entre nós, nossas mensagens. Afinal, somos um só povo.