Diego Vieira*
Há exatos 407 anos, morria Guy Fawkes.
Fawkes foi um soldado católico que participou da "Conspiração da Pólvora”, um levante com o objetivo de explodir o Parlamento inglês utilizando trinta e seis barris de pólvora estocados sob o prédio durante uma sessão na qual estaria presente o rei e todos os parlamentares.
Os conspiradores avisaram seus aliados a manter distância do Parlamento no dia marcado. Porém, um dos avisos chegou aos ouvidos do rei, que ordenou uma revista no prédio. Assim acabaram encontrando Guy Fawkes guardando a pólvora.
Durante seu interrogatório, Fawkes permaneceu desafiante, se negando a fornecer informações. Quando lhe perguntaram o motivo de estar em posse de tanta pólvora, lhes respondeu que era "para explodir todos vocês desgraçados bêbados de scotch de volta para as montanhas sujas de onde vieram". Sua coragem acabou rendendo certa admiração do Rei James, que o descreveu como "um homem de resolução romana".
Essa admiração não evitou que o Rei ordenasse sua tortura "de maneira progressiva e planejada". Fawkes inicialmente resistiu aos tormentos e não forneceu informações além de declarar "que rezava todo dia a Deus para o avanço da fé Católica e a salvação de sua alma podre".
Contudo, após mais de uma semana de tortura, Fawkes cedeu e entregou o nome de oito conspiradores. Sua assinatura de confissão, que era pouco mais de um risco ilegível, é indicio do sofrimento ao qual foi submetido. Fawkes e os demais conspiradores foram condenados a serem estripados e esquartejados antes da morte por decapitação. Em um último ato de desafio antes de ser conduzido ao local de execução, Fawkes conseguiu se desvencilhar dos guardas e pular de uma escada, quebrando o pescoço e evitando assim a tortura. Seu corpo foi esquartejado e exposto publicamente junto com o dos outros conspiradores.
Até hoje o rei ou rainha comparece ao Parlamento apenas uma vez por ano para uma sessão especial, sendo mantida a tradição de se revistar os subterrâneos do prédio, antes da sessão. Na Inglaterra existe a tradição de celebrar no dia 5 de novembro a Noite das Fogueiras, onde bonecos com a imagem de Fawkes são desfilados na rua, despedaçados e por fim queimados.
Um verso tradicional foi criado em alusão à Conspiração da Pólvora:
"Lembrai, lembrai, o cinco de novembro
A pólvora, a traição e o ardil;
por isso não vejo porque esquecer;
uma traição de pólvora tao vil"
Frequentemente Fawkes é referido como o "o único homem que entrou no Parlamento com intenções honestas".
A graphic novel V de Vingança, com roteiro de Alan Moore e arte de David Lloyd, possui grandes influências da "Conspiração da Pólvora", onde um personagem que utiliza uma máscara inspirada no rosto de Fawkes tenta promover a revolução em uma Inglaterra fictícia. A estilizada máscara foi popularizada pelo filme homônimo, que transformou o rebelde em defensor da liberdade.
A "carreira" revolucionária da máscara foi iniciada por grupos de ativistas como o Anonymous, que a assumiram como "cara pública" em 2008. Esta máscara deu resposta à necessidade dos membros do grupo de proteger as suas identidades e, ao mesmo tempo, simbolizar a defesa pelos direitos individuais. Em centenas de protestos atualmente, milhares de pessoas têm envergado esta máscara nas manifestações contra a avidez dos bancos e das grandes empresas e a crise financeira mundial
Mas, ironicamente, a popularidade das máscaras (com 100 mil exemplares vendidos por ano em todo o mundo) gera sentimentos conflituosos aos ativistas mais radicais. A "face de Fawkes" é, desde o filme V de Vingança, propriedade da Time Warner, multinacional que é uma das 100 maiores empresas dos Estados Unidos, e cada máscara vendida acaba por pôr dinheiro nos cofres de uma empresa que simboliza justamente aquilo que os ativistas combatem.
* Diego Viera é filósofo e antropólogo da Universidade Federal do Ceará
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