domingo, 29 de novembro de 2015

Indígenas participam de processo de patrimonialização da ayahuasca

Povos indígenas do Acre deverão ter participação ativa e decisiva no processo
A antropóloga do IPHAN Danielle Jatobá esteve nesta semana em Cruzeiro do Sul para mais uma etapa do relatório preliminar que irá nortear o processo de patrimonialização da ayahuasca.
A pesquisadora irá produzir um relatório a respeito do uso ritualístico da ayahuasca no contexto indígena.
“Todos os povos indígenas do Acre fazem uso da ayahuasca, ainda que de diferentes medidas e formas”, explica.
O pedido de patrimonialização partiu conjuntamente das três principais linhas religiosas ayahuasqueiras do Acre: Barquinha, a UDV, e o Santo Daime (Alto Santo e Cefluris).
Religião
Compreendido como religião por seus adeptos e tendo seu uso assegurado por lei em seu contexto religioso, a ayahuasca ganha contornos distintos quando estudada a partir do ponto de vista indígena.
“O conceito de religião é ocidental e urbano. No universo indígena, é algo mais totalizado”, explica Danielle.
“Chamar de religião (no contexto indígena) é uma simplificação. A ayahuasca é história, cultura, e pode sim, ser religião, também. Mas esta resposta deve partir dos próprios indígenas e essa realidade pode variar de aldeia para aldeia”, complementa.
Medicina
Nos estudos preliminares, uma palavra que aparece com frequência para designar a ayahuasca é ‘medicina’. A ideia de que a ayahuasca seja ela própria portadora de poder de cura para um número considerável de doenças está presente no imaginário sobre a bebida. Pesquisas científicas recentes corroboram esta visão quando apontam que, por exemplo, a bebida tenha potencial terapêutico no tratamento de doenças como depressão, mal de Parkinson, alcoolismo e até mesmo em alguns tipos de câncer.
“Medicina é um conceito tão possível quanto religião para a realidade dos povos indígenas, mas tanto religião, quanto medicina são categorias em nossa língua, e portanto, apenas uma tentativa de aproximação.”
Restrição de Uso
A antropóloga não a redita que o processo de patrimonialização da ayahuasca possa se refletir em alguma forma de restrição de uso ou de ‘engessamento’ das práticas.
“A patrimonialização não tem relação com propriedade intelectual ou patente. Tampouco trata-se de política de controle. Os atuais detentores do bem cultural permanecerão sendo os detentores. Trata-se de um reconhecimento do valor como referência cultural para o país.”
Também segundo a pesquisadora, não haveria interesse de restringir o uso fora das três tradições. “Isso seria inexequível”, explica.
Mesma bebida, caminhos diferentes
O uso ritualístico da bebida entre os indígenas e comunidades urbanas e rurais é uma especificidade do Acre em relação ao restante do Brasil, mas não em relação aos vizinhos amazônicos: Peru, Colômbia e Equador, onde pesquisadores apontam um uso milenar em diferentes tradições.
Em 2008, o Peru declarou a ayahuasca como patrimônio cultural do país. Na decisão assinada pelo diretor do Instituto Nacional de Cultura, Javier Villacorta define o uso da ayahuasca como tendo propósitos religiosos, terapêuticos e de afirmação cultural.
Canções e desenhos
Está associado ao uso ritualístico da ayahuasca entre os indígenas um repertório das mais variadas canções que vão desde ‘louvores’ a aspectos da natureza animal, vegetal e cósmica, a canções de cura e orações.
Outro elemento chave ligado ao uso da ayahuasca são os ‘kenês’ – palavra da família pano para designar os grafismos que traduzem em formas geométricas aspectos da natureza.
“Serão os indígenas que irão definir o que eles querem que faça parte deste processo ou não”, conclui a pesquisadora.

Leia mais sobre no site do NEIP – Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre PsicoativosMartini, Andréa. 2014. “Conhecimento indígena e a patrimonialização da ayahuasca”.

Paranoia (anti) rapé na fronteira

Gente que havia participado do lançamento do ponto de cultura Yorenka Atame, em Marechal Thaumaturgo, passou pelo constrangimento de ver o seu rapé apreendido durante revista dos soldados do Exército Brasileiro na pista de pouso do município. Até mesmo indígenas tiveram seu rapé apreendido, ainda que o porte esse tipo de substância de uso cultural, lhes seja assegurado por lei.
Os soldados justificaram a apreensão por se tratar de “produto da fauna e da flora local” (sic). A explicação não convence. Feito a partir de tabaco (produzido ali mesmo em Marechal) e cinza de cascas de árvores, o rapé tem menos de “fauna e flora local” do que os cocares e brincos emplumados que passaram sem problema.
A implicância com um produto que até bem pouco tempo não era incomodado com os aeroportos pode ter relação com uma reportagem recentemente apresentada pela TV Gazeta, onde, legitimamente, se apresentam preocupações com o abuso do rapé e sua rápida popularização no meio urbano, incluindo aí, muitos jovens e adolescentes nas escolas.
Digo que a preocupação é legítima, já que ate mesmo os pajés alertam para os danos de um eventual abuso do rapé.
O problema é que nas instituições da nossa sociedade, as reações a um fenômeno cultural, acabam tendo um viés proibicionista e criminalizador, principalmente quando se tratam de produtos da ‘exótica’ Amazônia.
Não se vê, por exemplo, alguém defendendo a proibição de Nutela ou Coca Cola, que podem ser tão viciantes ou, no caso da Coca Cola, especialmente danosa à saúde.
No caso do rapé, kambô ou mesmo da ayahuasca, cada vez mais se faz necessária a circulação de informações claras a respeito. Uma sugestão é que lideranças do meio indígena venham a cada vez mais a público, fazer estes esclarecimentos. Mas pode ser necessário também realizar encontros entre indígenas e não-indígenas, já que o uso destas substâncias no meio urbano, é uma realidade.

Livro da Cura Huni Kuin é um dos vencedores do Prêmio Jabuti deste ano

A comissão organizadora do 57º Prêmio Jabuti divulgou nesta quinta-feira (19) o resultado final da premiação deste ano. O Livro Una Isi Kayawá, escrito pelos pajés Huni Kuin do rio Jordão em parceria com o Jardim Botânico do Rio de Janeiro conquistou o terceiro lugar na categoria Ciências da Natureza, Meio Ambiente e Matemática.
O livro teve um processo criativo bastante original, utilizando os cadernos de anotações dos pajés do rio Jordão. Segundo a editora Anna Dantes, a ideia do livro teve início a partir de um sonho do pajé Agostinho Iká Muru. O pajé, juntamente com o taxonomista Alexandre Quinet, são os organizadores do projeto.
O livro Mata Atlântica – Uma História do Futuro e,  Agricultura Conservacionista no Brasil foram respectivamente os vencedores do primeiro e segundo lugar da mesma categoria.
O Prêmio Jabuti, considerado o mais importante do mercado editorial brasileiro, recebeu 2.573 inscrições este ano.
A cerimônia de entrega aos vencedores do Prêmio Jabuti 2015 será realizada em 3 de dezembro de 2015, no Auditório Ibirapuera, em São Paulo.

domingo, 4 de outubro de 2015

Homofobia ou Fundamentalismo ?



homofobia

  1. substantivo feminino
    rejeição ou aversão a homossexual e à homossexualidade.

fundamentalismo
substantivo masculino
  1. 1.
    rel movimento religioso e conservador, nascido entre os protestantes dos E.U.A. no início do século XX, que enfatiza a interpretação literal da Bíblia como fundamental à vida e à doutrina cristãs [Embora militante, não se trata de movimento unificado, e acaba denominando diferentes tendências protestantes do sXX.].
  2. 2.
    p.ext. qualquer corrente, movimento ou atitude, de cunho conservador e integrista, que enfatiza a obediência rigorosa e literal a um conjunto de princípios básicos; integrismo.

A entrevista com Bibiano Queiroz, (por enquanto) do PSOL deu o que falar. Foram mais de 20 mil compartilhamentos, o que é muito, mesmo para uma matéria em um site nacional.
As entidades de defesa dos direitos LGBT rapidamente repudiaram a fala do (supostamente) presidente municipal do PSOL em Cruzeiro do Sul pela “Unidade Socialista”, tendência apontada como muitos membros do partido como sendo “de direita”.
As declarações de Bibiano foram classificadas como “homofóbicas”, e é sobre este ponto que pretendo me debruçar neste texto (sem duplo sentido, por favor).
Os evangélicos em geral não aceitam a pecha de homofobia a eles imputada. O argumento é de que homofobia, na acepção da palavra, significa medo, ódio ou rejeição aos homossexuais.
Os evangélicos argumentam que não tem “medo, ódio ou rejeição” aos homossexuais, mas que a prática é condenada pelas escrituras, ou pela interpretação que dela fazem.
Em nenhum de meus textos ou postagens, imputei a Bibiano a classificação de homofóbico. Deixo que façam isso as entidades de defesa LGBT que tem mais legitimidade para tal.
Contudo, afirmo sem medo de errar, que a posição de Bibiano é sim, fundamentalista.
Explico. Fundamentalismo não se trata de usar uma barba comprida e amarrar explosivos na cintura. Fundamentalismo significa simplesmente a concepção de que um texto religioso deve ser utilizado para reger a vida civil da sociedade. E aí tanto faz ser a bíblia, o alcorão, ou o livro dos Mortos Tibetano.E o fundamentalismo, pasmem, não nasceu no oriente, mas sim nos EUA.
Ocorre que, Bibiano, ou qualquer outro, ao achar que pode aplicar a interpretação bíblica corrente de que a homossexualidade é condenável e que por isso não deva filiar homossexuais ao partido, na prática estaria restringindo um direito cidadão, algo que é regido pelas leis laicas do estado: constituição, código civil e regimento partidário. Ainda que o mesmo não tenha “ódio, medo, ou rejeição” aos homossexuais, na prática sua ação resultaria em perda de direitos devido à orientação sexual, algo que é vedado pela constituição do país. Ou seja, o resultado é sim, homofóbico.
O fundamentalismo cresce no mundo inteiro, e no ocidente, ao que parece os cristãos são os que menos se dão conta disso. Encaram com naturalidade que sua interpretação de mundo, seja implantada por força de lei, ao conjunto da sociedade.

E é aí que mora o perigo. Pois a homofobia, talvez afete diretamente apenas aos homossexuais, mas o fundamentalismo, afeta a todos nós.


sábado, 20 de junho de 2015

Ágora X Púlpito

Parodiando o relógio do apocalipse do filme "Watchmen" é possível dizer que o recente entrevero virtual entre Boechat e Malafaia, adiantou em um minuto o relógio da contagem regressiva para a "Gospelândia", o estado teocrático que dia após dia cresce como um câncer dentro do sistema polítoco e da sociedade brasileira. Já afirmei em postagens anteriores que a "gospelândia" que há menos de uma década atrás apresentava-se como um projeto político, já deixou de ser projeto.

A Gospelândia não é mais um pesadelo, porque ela já é uma realidade com cor, forma, tamanho e sobretudo, líderes. adquire consistência e materialidade física e jurídica através do Congresso nacional.

A cada dia, o centro da vida política do país se desloca da Ágora, para o Púlpito.

A existência de nossa moderna democracia só foi possível por ter existido lá em seus primórdios, um espaço de discussão civil, justamente, a ágora. Nela, os cidadãos exerciam o seu direito à voz. Pontos de vista divergentes eram postos à prova por seus debatedores e argumentadores que aí tinham a oportunidade de fazer vencer suas teses.

O púlpito é o oposto da ágora. É onde um líder pretensamente ungido fala sozinho pelo tempo necessário a produzir uma catarse no público.

O problema destes supostos líderes é que eles não se contentam com o público de suas igrejas. Sentem-se capazes de ditar as normas da vida civil do país. (Bom dia, fundamentalistas!).

É o caso de Malafaia. Após produzir a catarse hipnótica nas ovelhas que zelosamente tosquia dia após dia, sente-se capaz de voos mais altos. Por isso intromete-se descaradamente na vida política do país.

Boechat está coberto de razão quando afirmou que "no âmbito das igrejas neopentecostais tem acontecido incitação ao ódio e á intolerância religiosa, mais do que em outros ambientes".

Há vídeos que comprovam isso. Pregações religiosas que incitam os fiéis a atacar membros das religiões afro-brasileiras e destruição de imagens católicas. Há vídeos inclusive protagonizados por Marco Feliciano. Em um deles, um pastor não apenas incita o ataque às imagens como ainda reforça a ideia de que o fiel que seja preso e penalizado por tal ato, seria recompensado por estar sendo preso "por amor à Jesus". Para reforçar o efeito dramático, o pastor beija algemas imaginárias num púlpito para centenas de pessoas. Se isso não é incitação à intolerância, o que é então? Esse é o caminho seguro para um estado fundamentalista: a "República da Gospelândia"

Depois de nos acostumarmos com as notícias de ataques a templos e imagens a novidade agora parece ser agressões a pessoas também. Quando nos acostumarmos a isso, não mais nos importaremos que figuras como Malafaia decidam o destino da vida social do país.

Cada vez menos importa o debate entre juristas para definir, por exemplo, questões como a maioridade penal. Isto está sendo decidido nos púlpitos de templos e igrejas, para somente depois ir à ágora, que cada vez mais perde seus espaço de debate, para apenas referendar o que já foi incutido na cabeça das ovelhas pelos seus pastores.

E se existe hoje dentro do meio evangélico vozes contrárias à tragédia que se anuncia, é bom que comecem a falar e se expressar, a saírem do púlpito e virem a ocupar o espaço público da ágora e questionar estes supostos líderes que se arvoram ao papel de "porta-vozes" de todos evangélicos. Se estes não forem questionados "de dentro", continuarão suas pregações fundamentalistas até que toda "ágora" seja apenas uma extensão do seu "púlpito".

Caso resolvam se calar e deixar "o barco correr" é bom que estejam preparados para depois, ocuparem o mesmo lugar na história ocupado pelos alemães que, mesmo não sendo nazistas, deixaram a serpente crescer no jardim de suas casas.








terça-feira, 9 de junho de 2015

Vistamos a irracionalidade de amor

O episódio do Boticário já cantado e decantado em versa e prosa, me levou a algumas reflexões e a pelo menos duas conclusões.
A primeira é de que resultou em uma vitória sem precedentes sobre o dito “movimento evangélico”, ou mais precisamente, sobre a parte dele que é capitaneada pela banda podre desta imensa comunidade evangélica. Comunidade que, diga-se de passagem, reagiu de maneiras diferentes ao episódio, tornando mais evidente algo que já se sabia: nem todo evangélico é “Malafaia”. Pior para ele, que se portava como espécie de porta voz desta comunidade. Perdeu liderança dentro do movimento.
A participação de evangélicos na “Marcha par Jesus” em São Paulo, certamente é mais um demonstrativo de que uma parcela cada vez maior de evangélicos, busca se distanciar da pecha de “homofóbica” e que rejeita a suposta liderança de Malafaia, Cunha e companhia bela.
Tenho lido com satisfação, vozes dissonantes de teólogos protestantes (ou seriam “evangélicos”?) que conseguem se contrapor aos discursos totalitários destes barões midiáticos do movimento evangélico. Quero crer que estes teóricos tenham conseguido se fazer ouvir por uma parcela importante da comunidade evangélica, talvez apenas lembrando o óbvio da mensagem da “boa nova” uma redenção para todos através do amor incondicional. Ora, se o amor é incondicional, não faz sentido pensar em um amor seletivo apenas para “escolhidos” que de preferência, recolham dízimo.
Não diria que foi apenas uma vitória dos homossexuais sobre este “movimento”. Diria que foi uma vitória da lógica sobre a irracionalidade.
Malafaia ao sugerir o boicote ao boticário, expôs a irracionalidade de sua aparente lógica. De fato, pelo mesmo motivo a comunidade evangélica por “coerência” seria “obrigada” a rejeitar o próprio mundo em que vivemos hoje, com destaque à Alan Turing um dos principais responsáveis pelo advento do computador. Ele próprio um homossexual que sofreu perseguições inimagináveis nos tempos de hoje, mas sobretudo um cientista e matemático brilhante que nos legou uma das maiores “bênçãos” do mundo moderno.
Antes que os ateus militantes e cientificistas toquem suas trombetas, faço a ressalva, em boa hora, que sem irracionalidade, tampouco haveria amor também. Sem amor, sem dia dos namorados, sem dia dos namorados, sem propaganda do boticário.
Não senhores, a lógica sozinha não “salva”. Pelo contrário: é na razão insensível que se encontram algumas das mazelas de nosso mundo. O poder do comercial reside justamente na sensibilidade com que tratou o tema.
Proponho portanto, um brinde: Neste Dia dos Namorados brindemos à irracionalidade vestida não de ódio e segregação, mas do amor e da paixão em todas as cores. Afinal, eu também tenho a minha.
...
Opa... tava tão bom que eu ia me esquecendo do resto. Culpa de uma morena.
Vamos à segunda conclusão.

A dois passos da “gospelândia”

A aprovação do projeto de lei que amplia ainda mais o benefício de imunidade tributária aos pastores foi mais uma demonstração de que, parafraseando a música da Blitz dos Anos 80 “estamos a dois passos da ‘gospelândia’ ”, estamos cada vez mais próximos do fim de um estado laico de direito.
Para quem ainda não sabe, a “Gospelândia”, é uma alcunha para uma espécie de “reino dos escolhidos” que virá em substituição ao estado laico. Este reino, não será encantado, mas pelo contrário, totalmente desencantado, porque encanto não é coisa de deus e se não é de deus, é pecado e o pecado não entra na Gospelândia: o reino dos escolhidos.
A “Gospelândia” é a falência, o fracasso do estado laico. Um estado que permanecerá apenas nominalmente laico, mas que deverá perder cada vez mais espaço para uma concepção religiosa específica, pois em torno dela se agregam todos os medos. É o “nazi-fundamentalismo”, um bunker contra as mudanças trazidas pelos ventos da contemporaneidade.
A “Gospelândia” é a realização suprema da frase que nos é esfregada na cara quando entramos em uma cidade e nela está estampada a frase “Cidade tal é do Senhor Jesus”.
Na sua célebre exortação “Deus nos Livre de um Brasil Evangélico”, o pastor Ricardo Gondim captou a essência da frase: não há aí uma preocupação genuinamente “espiritual” de salvação, mas um projeto político pernicioso, totalitarista que pretende submeter não apenas a política do estado, mas a cultura, a arte e o comportamento civil do país.
Com Cunha à frente deste projeto, a “Gospelândia” toma corpo, cor e forma. Não é mais apenas um fantasma na cabeça de teólogos e pastores descontentes como Gondim: é agora fato consumado pelo legislativo e sancionado pelo executivo.
Não é a uma democracia capenga como a nossa que fará frente ao “Triunfo da Vontade” de milhões de crentes. Aliás, democracia alguma faz frente. Weimar não fez frente à Hitler e não será a nossa que o fará. Quando se forma uma maioria, esta é esmagadora.
Mas mesmo nessa nossa histriônica republiqueta, também há limites para a “Gospelândia”.
E os limites são impostos pelo capitalismo. Este sim é o terreno sagrado que não pode ser maculado por Malafaia, e nem por ninguém.
A lógica (ou seria dogma?) do capitalismo diz que homossexuais são consumidores e é por esta razão que merecem respeito. Malafaia pecou contra o sacro-santo princípio do capitalismo ao propor boicote. É por isso que não vai pro céu.
Capitalismo e Protestantismo são duas cabeças da mesma cobra. É impossível distinguir qual é o criador e qual é a criatura.
Mas é o Capitalismo que dá as regras deste mundo. Manda quem pode, obedece quem tem juízo.

Ideólogos embandeirados defendendo suas teses cinzentas não são capazes de perceber a sutil ironia. Somente a leveza de um sufi pode apreciar a visão de uma cobra comendo a si mesma. E dançar ao seu redor.

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Charlie, Charlie - Respeitem os espíritos. E os espíritas

Estava relutante em escrever sobre o tal assunto: "Charlie, Charlie".

Mas há um momento em que não é mais possível se furtar sobre determinado tema, principalmente quando este passa perigosamente a ser usado como mais um instrumento de discriminação religiosa nas escolas.

O fato do assunto ter se tornado pauta na imprensa, não deveria ser motivo de surpresa, princialmente nesta semana em que a revista de maior circulação no país escolhe o OVO como matéria principal de sua edição na mesma semana em que houve o escândalo dos dirigentes da CBF e as manobras de Cunha no Congresso.

Pelo ponto de vista comportamental, o assunto já virou pauta.

A questão é portanto, como abordar o tema, sem ser piegas, sem cometer achismos e principalmente, sem cometer preconceito religioso.

Na internet, já circulam inúmeros posts explicando que o tal "Charlie, Charlie" não passaria de uma jogada de marketing do filme "A Forca".

Poderia escrever falando sobre a vocação maldita do cinema de hollywood em legitimar preconceitos de toda ordem, incluso aí os de ordem religiosa. Mas precisaria fazer outra postagem para tanto.

O tal "Charlie, Charlie", ainda que possa ser fruto de uma jogada de marketing, não é mais do que uma derivação empobrecida da Tábula Ouija, assim como é também a famosa "Brincadeira do Copo".



Dito isto, seria preciso dizer quais as explicações possíveis para este fenômeno.

Há pelo menos três.

A primeira delas nos fala do efeito ideomotor, em suma, as pessoas moveriam estes objetos (copo, caneta e etc) de maneira involuntária e inconsciente, possibilitando tais especulações.

A segunda delas, é a radiestesia. Críticos do efeito ideomotor buscam explicações através do eletromagnetismo e de mudanças na percepção que ainda assim não seriam necessariamente, sobrenaturais.

 A terceira delas é a explicação espiritualista, na qual de fato espíritos dos mortos poderiam se comunicar através destes instrumentos.

É importante fazer a seguinte ressalva: O códice espírita kardecista não aprova tais práticas. Em O Livro dos Médiuns, Alan Kardek afirma que este tipo de prática seria mais propícia a atrair espíritos zombeteiros e levianos.

Sobre isto, vivenciei uma situação na minha adolescência que foi deveras instrutiva, e que gostaria de compartilhar por meio desta postagem.

Tinha por volta de 16 anos de idade e na escola de ensino médio que frequentava surgiu a tal "brincadeira do copo". Para quem não conhece a brincadeira, ela segue os mesmos princípios da tabula Ouija: as letras do alfabeto dispostas em circulo e as palavras sim e não. Os participantes colocam seus dedos em cima do copo e passam a fazer perguntas. O copo então se move na direção das letras e das palavras sim e não, respondendo às perguntas.





Fizemos a tal "brincadeira" algumas vezes. Lembro-me que havia uma sequência de perguntas iniciais. - Tem alguém aí? - Você é um espírito de luz?

Em uma destas ocasiões após as duas respostas afirmativas do "copo", tiveram início uma série de respostas desconexas, gerando conflito entre os participantes que passaram a acusar um ao outro de estarem manipulando o copo de acordo com sua vontade.

Foi então que um dos participantes falou:

- Gente, se ele fosse um espírito de luz, nós não estaríamos brigando.

E nesse momento, o copo realmente parou de se mover

Na terceira e última vez que participei da tal "brincadeira", após responder afirmativamente às duas perguntas iniciais, o copo não mais se movia. Foi quando então algum de nós resolveu perguntar.

- O que você quer que a gente faça?

O Copo então começou a se mover na direção das letras E, depois um S, depois um T, depois um U, depois um D... então quando a palavra se tornou óbvia, alguém disse:

E-S-T-U-D-A-R

E o copo não mais se moveu.

Na ocasião interpretei o ocorrido de duas maneiras. A primeira que aquele deveria ser de fato um espírito de luz, que não queria nos fazer perder tempo com tais bobagens e nos mandava para algo mais produtivo; Estudar.

A segunda, é de que se realmente eu tivesse interesse em conhecer tais fenômenos, também deveria, estudar.



quinta-feira, 28 de maio de 2015

Onde nos levará a ligação Cruzeiro do Sul e Pucallpa?

Documentário de Fernando Valdívia vai além do lugar-comum e mostra o tamanho do problema que seria construir uma ligação rodoviária ou ferroviária entre Cruzeiro do Sul e Pucallpa.

Segundo o documentário, a proposta de integração regional é apenas cortina de fumaça para transformar a região em corredor de exportação de soja para a China, conforme previsto no IIRSA.

Assista ao documentário

quarta-feira, 27 de maio de 2015

No Universo da Cultura, o Centro está em toda parte

Pra mim é impossível não cruzar a praça do relógio da USP, sem tocar mentalmente a empolgante música de Bob Dylan, com os acordes de Jimi Hendrix​ "All Along the Watchtower". Essa música sempre me soou como um chamamento coletivo para algo que está mais além

Se você nunca ouviu, ouça.

Impossível também não meditar sobre as palavras escritas ao redor da torre "No Universo da Cultura, o Centro está em toda parte".


Há diferentes interpretações para o que o filósofo, jurista e reitor da USP Miguel Reale quis dizer com isso.
O mais óbvio é dizer que ele queria que a torre do relógio fosse o centro da cidade universitária.

Prefiro olhar além e pensar que que o real sentido seja o que de fato estas palavras dizem: onde se busca cultura, ali é o seu centro. Gosto de pensar que Miguel Reale buscava desde ali uma visão descolonizada, em que o centro não estaria na Europa ou nos EUA, mas onde quer que se busque conhecimento. E isto certamente vale para a própria universidade e deva ser constantemente lembrado:

"O centro está em toda parte"- bem poderia ser um mantra mágico proferido todas às vezes em que a universidade ficasse ensimesmada, incapaz de olhar sequer por cima dos seus muros, o que se dirá, olhar além, na direção dos rios e florestas em que habito - OM

Se essa não foi a intenção do reitor, furto-me ao sacrossanto direito à antropofagia para cobrar, como diria o não menos importante, Alberto Lôro, minha "parcela fatal" e assim juntar a frase ao meu caldeirão, como um ingrediente mágico especial.

No meu caldeirão de conhecimento, o centro do universo está agora dentro de um pote de barro rezado por um pajé centenário, e eu deitado em uma rede assisto à sua aula.

Minhas notas são sofríveis, pois me faltam pré-requisitos básicos como a língua e as vivências naquelas matas, na caça, na pesca, nos roçados. Falta-me uma pele que me acoberte dos piuns, mas passa-se querosene, e vai se vivendo.

Sou aluno especial, cotista diria, de uma generosidade tremenda nesta universidade coberta de palha, onde os pássaros são professores e o bugio marca as horas. Lá vem eu chegando atrasado, louvada seja, a paciência de Yawá.

E porque cargas d'água insistir em um sistema de conhecimento que sequer é reconhecido, que não traz canudo nem glória, e nem grau?

Talvez seja pura teimosia, apenas isso e meu sangue aragonês se dá por satisfeito com esta explicação. Ou talvez seja para atender a um chamado que me foi feito nessa mesma floresta, pelo mesmo Yawá, há mais de 10 anos atrás.

Talvez seja para fazer ecoar na cidade um grito que só se ouve na mata.

Ou talvez seja o contrário: fazer ecoar na mata, o grito de uma geração que se perdeu nos labirintos de asfalto e de cimento que se tornaram as grandes cidades, estas gaiolas ausentes de sentido.

Verdade é que do ponto em que estou, isso cada vez menos importa.

Muito mais tem importado o caminho em si, o não estar parado, o não deixar ser paralisado pelas forças mágicas e hipnóticas, serpentes da cabeça da medusa que regem a matrix de nossa era.

Antes havia o apenas ir. Uma fuga, uma carreira desenfreada, pois atrás de si há o fogo da devastação. Aí descobre-se que o fogo e a devastação, tal como "no universo da cultura", também estão em toda parte.

Se antes havia o sentido de apenas ir, tal qual a marcha dos queixadas verdadeiros, há agora também o "vir": o voltar, não no sentido de quem apenas volta de onde veio, mas também que trouxe o que buscou, e que mostra, a que veio e em que acreditou.


Todos ao redor da Torre do Relógio (tradução possível, mas não exata)

Deve haver algum jeito de sair daqui
Disse o piadista ao ladrão
Lá tem muita confusão
Eu não tenho nenhum alívio

Homens de negócio bebem meu vinho
Os homens do arado cavam minha terra
Nenhum tem algum nível em suas mentes
Ninguém está fora deste mundo

Não há razão para estar excitado
O ladrão falou amavelmente
Há muitos aqui entre nós
Que pensam que a vida é mais que uma piada
Mas você e eu, nós passamos por isso
E este não é nosso destino
Então vamos parar de hipocrisia
A hora já começa tarde

Tudo ao redor da torre
Os príncipes mantiveram a vista
Quando todas as mulheres vieram e foram
Empregados descalços também

Lá fora na distância fria
Um gato selvagem rosnou
Dois cavaleiros estavam se aproximando
E o vento começou a uivar

Tudo ao redor da torre
Em toda parte

Em toda parte, eu fui





Narrador: sujeito sonhador - Reflexões a partir da XXI Semana de Ciências Sociais da FFLCH - USP

Só mesmo Ailton Krenak para "colocar na roda" da academia o livro "Muká, A Raiz dos Sonhos".

Foi isso que aconteceu nesta terça-feira, dia 27 de maio de 2015. Atendendo a um convite do mesmo, participamos conjuntamente das apresentações dos livros de nossas respectivas autorias durante a XI Semana de Ciências Sociais.

Eu com o já mencionado "Muká" e ele com o seu livro homônimo, o número 50 da coleção encontros (Editora Azougue).

Até então, percebia um certo "torcer de nariz" da universidade e em especial, da USP. Logo ali, onde me formei, por assim dizer "minha aldeia", foi onde encontrei a menor abertura e a maior rejeição a este trabalho.

Talvez olfatos delicados tenham identificado "hum, isso tá me cheirando a livro exotérico", e tenham parado ali mesmo na capa.

Mal sabem eles que em muitos espaços "exotéricos" o livro foi igualmente rejeitado. Talvez porque não fale aquilo que se quer ouvir nos círculos exotéricos. Meu livro não fala de "paz e amor", não oferece bálsamos curadores e nem saídas miraculosas para os mais de cinco mil anos de civilização ocidental. Sorry!

Por outro lado, sou também um estranho no ninho em um meio indígena que busca afirmar-se cada vez mais como autor de sua própria história, tendo com isso praticamente criado um gênero próprio de literatura.

Diante de uma platéia formada por estudantes universitários, muitos dos quais indígenas de diferentes povos, sou obrigado a refletir cada vez mais não apenas sobre o livro, mas sobre que papel pretendo cumprir como um escritor não-indígena que participa das formas tradicionais de transmissão de conhecimento.

Portanto, só posso expressar minha gratidão ao meio universitário por me impulsionar a estas reflexões.

Narrador: sujeito sonhador

Costumo dizer que não fui chamado para fazer uma tese de doutorado, ou mesmo uma reportagem. Fui chamado para fazer o Samakei do Muká. E assim o fiz.

Por meu juramento no terreiro do Muká, sou compelido a acreditar que quem me chamou, tenha sido o cacique Nixiwaká, o pajé Yawá, ou o próprio Muká, com seus Shenis e Yuvãs do terreiro, ou mais provável ainda, o alinhamento de todas estas vontades, incluindo aí a minha própria; sempre soube, que o resultado viria na forma de um texto.

Todos sabiam desde o início que a escrita seria pelo menos um dos "Cawá Wakin" (consagração) resultantes do Samakei. Isso estava escrito antes mesmo de sê-lo. Os sonhos do Muká reforçaram e reafirmaram isso cada vez mais.

Escrever, cantar e dançar estavam em meus sonhos.

Duvidar disso seria duvidar do Muká.

O livro não é "exotérico". É sim fruto de uma imersão que não faria sentido algum se não tivesse como motivação uma busca pessoal.

Por mais penas que coloque em minha cabeça, meu livro não é por assim dizer "indígena", a menos é claro, que um diz eu seja capaz de dar voz plena "não a esse aqui que está falando agora, mas àquele que eu vi sonhando".

Tampouco fiz do sistema de conhecimento de meu pajé um "objeto" de estudo. E que tremenda falta de respeito teria sido.

Talvez um ponto pacífico para esta escrita seja: narrativa. Viver e narrar. Apenas isso. Sendo que o narrador, é antes de tudo, também ele um sujeito daquilo que vive. Tão óbvio, tão simples. Mas olvidado em séculos de elucubração masturbatória de um sujeito que põe-se atrás da realidade, como se tal coisa fosse possível, com o único objetivo, na verdade, de exercer um poder sobre os demais sujeitos que não dominam a mesma linguagem.

Nessa narrativa isenta de isenção, o narrador descobre-se sujeito de sua caminhada e das conclusões a que ele mesmo leva. Um sujeito que ainda que não seja propriamente "exotérico", não nega a sua dimensão transcendente, pois descobre-se que não há outra maneira de se ser pleno.

Este narrador-sujeito-transcendente, vive, sonha e narra, pois isso é parte intrínseca a sua natureza humana, e assim matura a sua própria existência.

* Não se preocupem com a boca serrada de Ailton. A culpada foi uma esfiha que chegou bem na hora do "selfie". Ou, seria o contrário: o selfie" que foi na hora da esfiha?

quarta-feira, 29 de abril de 2015

Paulista não praticante

Uma amiga e colega jornalista acaba de me entrevistar para um matéria, e talvez por deferência à minha pessoa, fez a gentileza de me encaminhar o texto, dando-me liberdade para acrescentar ou tirar algo.

Lá na minha ficha de apresentação, a matéria trazia a informação “jornalista paulista”...

Aquilo me soou mal. Pedi à colega que colocasse apenas “nasceu em São Paulo”.

Parece a mesma coisa, mas não é. Acho que não basta nascer em São Paulo para ser “paulista”.

Penso que para ser “paulista” é preciso praticar. É preciso viver a constante da megalópole.

Parafraseando Euclides da Cunha, o paulista é antes de tudo, um forte. Só algum tipo de força interior pode explicar como seus quase 20 milhões de habitantes suportam um dia-a-dia que me parece insuportável.

Eu não. Eu sou um fraco. Um trânsfuga que trocou a fumaça da capital, pela brisa amazônica. Que trocou o congestionamento pelo embalo da rede. Sou um covarde, é isso que eu sou.

Penso em mim como aqueles filhos de família católica que são batizados, catequisados, crismados, mas que nunca de fato acreditaram na ladainha do padre e que ao atingirem a idade adulta, atiram-se ao ateísmo de Marx, Nietzche, ou Sartre com uma avidez por assim dizer, fervorosa.

Este “fugitivo” deve lembrar o sabor da hóstia, o perfume do incenso, o tom monocórdico do sermão do padre, mas isso faz dele um “católico”?

Como um paulista não-praticante ainda guardo a lembrança corporal do stress, do medo e da sensação de estar cercado por milhões de seres humanos, sem contudo viver plenamente a minha humanidade.

Por esta razão, só posso ter um respeito ainda maior por quem, além de sobreviver nesta selva, ainda luta para torná-la mais humana. Estes, vão além de serem paulistas praticantes. São verdadeiros sacerdotes.

Tenho por exemplo, uma amiga, que nasceu no nordeste, mas vive intensamente tudo de bom e de ruim que a vida em São Paulo oferece. É uma paulista praticante. Se eu decidisse voltar a viver em SP teria que pegar aulas com ela.

Muito mais paulistas do que eu são os bolivianos que agora ocupam o bairro decadente onde eu nasci,  ou os nigerianos que andam pelo centro da cidade em busca de trabalho. Estes são os paulistas, não eu.  

Eu apenas virei as costas e deixei tudo isso para trás. Não mereço ser chamado de paulista. 








   


quarta-feira, 22 de abril de 2015

“O poder para fazer o mal é o mesmo para curar”

Por Patrícia Flores*

O livro “Muká – A Raiz dos Sonhos”conta a experiência do jornalista Leandro Altheman em um processo de formação espiritual com índios yawanawás do Acre.

O relato detalhado de Altheman sobre o que vivenciou junto com esses índios é uma viagem a um mundo inimaginável, são janelas que se abrem em direção a um mundo que consegue ser fantasioso e concreto ao mesmo tempo. Acompanhar o jornalista em sua viagem espiritual de auto-conhecimento é pesquisar um pouco sobre a matéria-prima de todos nós seres humanos. Durante a leitura do livro, é impossível não pensar em Shakespeare e nas frases de Próspero na peça A Tempestade: “Nós somos feitos da matéria de que são feitos os sonhos; nossa vida pequenina é cercada pelo sono”. A obra de Shakespeare é povoada pelo mundo dos sonhos e dos espíritos. É através do contato com um mundo invisível que alguns de seus personagens enxergam o cerne da realidade do mundo “visível”. E é exatamente isso que Leandro Altheman parece ter vivenciado. Em determinados momentos do livro o leitor terá a impressão de também estar fazendo uma jornada ao centro do seu eu ou ainda ao núcleo da nossa sociedade.

É importante dizer o sentimento de privilégio que o leitor adquire lendo o livro, pois a experiência do autor não é algo corriqueiro: poucos são “escolhidos” e se mostram dispostos a passar pelo longo e profundo ritual de iniciação espiritual, que tem como base digerir uma raiz sagrada chamada de “Muká” pelos yawanawás. O ritual da raiz de gosto amargo exige uma dieta de um ano sem doces e relações sexuais, além de rituais e dieta de preparação e um período de isolamento de pelo menos dois meses, no qual a dieta se torna ainda mais rigorosa. No isolamento, sem comer nada nas primeiras 24 horas depois de digerir o muká, as refeições das semanas seguintes se limitam a alguns peixes (sem esporão), arroz, banana, feijão, cuscuz, açaí e mais alguns poucos alimentos. O tempero da comida é preparado sem sal, mas com limão e pimenta e não é permitido beber água pura. Tudo isso transforma a caiçuma de milho com seu sabor adocicado na grande “dádiva” da dieta. É como se ela fosse o momento lírico da refeição.

Mergulhamos assim no mundo do muká, do uni, do samakei, do sheki mamã, do shuintiya, do vaná, dos kenês, do nanê, dos saitis, do sepá, do xinã, do vê kuxi, do uriá. De repente, palavras que nunca ouvimos se tornam familiares e enchem nosso pensamento de um ritmo que nunca ouvimos, mas que tomou forma em algum lugar dentro de nós.

É linda a capacidade do livro de nos encher de respeito pela cultura indígena. Acompanhamos ali o rico mundo cultural e simbólico de um povo enraizado na floresta. Percebemos a sua relação com a terra, com as plantas e com os animais. E além de ser maravilhoso saber que isso existe, é um aspecto muito importante em tempos em que se continua desrespeitando tanto o direito indígena sobre a terra, com demarcações e desapropriações de terras absolutamente arbitrárias – sem falar nos assassinatos que ocorrem por essa causa. Como seria produtivo se os governantes que decidem sobre as terras indígenas tivessem consciência real da relação do índio com a terra, conhecessem um pouco do respeito, da troca e da sabedoria indígena em relação ao universo no qual todos nós estamos inseridos. E não é que essa relação seja romantizada no livro. O que testemunhamos nos relatos de Leandro Altheman do seu cotidiano em meio aos yawanawás é uma relação concreta, respeitosa e produtiva com a floresta e os seres que a habitam.

O que também impressiona no livro é a “convivência” que os índios têm com seus ancestrais. Esses últimos estão presentes no dia-a-dia. Seus desejos e avisos são recebidos através de sonhos e mirações (visões que se tem quando se toma ayahuasca) e muito respeitados. Não se entra aqui no mérito de acreditar ou não em uma comunicação que ocorra em um mundo onírico ou alucinógeno. Não é esse o âmago da questão. Não é preciso acreditar nisso para constatar a presença dos ancestrais na vida dos índios yawanawás. É real o fato de que eles acreditam continuar em contato com os que já foram e de que eles levam isso muito a sério e de forma absolutamente conseqüente.

O mérito do relato de Leandro Altheman é que somos apresentados e nos familiarizamos com aspectos como esse da cultura yawanawá aos poucos. Temos a impressão de fazer o mesmo caminho que o autor, de descobrir e de nos acostumar com os “novos elementos” dessa cultura junto com ele. Suas descobertas, observações e reflexões são escritas de forma muito sincera e pessoal, o que nos leva a embarcar nessa viagem. Na introdução do livro, o autor escreve: “Entendi que revelar minhas expectativas, crenças e visões particulares de mundo seria uma maneira honesta de mostrar ao leitor a subjetividade por trás de meus relatos,em vez de tentar me esconder sobre o manto de uma falsa objetividade”. É exatamente essa subjetividade do autor que envolve o leitor. “Observar” o contato com os índios com os olhos e o ritmo de Altheman faz com que o leitor tenha tempo de se habituar e se afeiçoar com o mundo yawanawá.

Um grande aprendizado do livro é também o respeito dos índios em relação aos outros seres humanos, sem se importar com a idade ou a etnia. Eles respeitam, admiram e buscam a troca com outras tribos, ouvem com atenção e inserem em todas as atividades crianças, mulheres, homens e idosos, além de terem agregado rapidamente um branco não só no seu cotidiano como em rituais sagrados de sua cultura, riqueza imensurável de um povo. Aliás, Leandro Altheman não é o único “branco”a tomar o muká. No livro, ele conta que um ano antes um antropólogo “branco” (Txai Terry) também fora iniciado no muká. E depois dele, outros “brancos”também terão esse privilégio. Acredita-se ser esse um desejo dos ancestrais.

Percebe-se a preocupação dos índios em explicar tudo com detalhes para o autor, fazer com que o novo agregado esteja realmente informado sobre toda a história e cultura da tribo. Ele é inserido sem distinção naquele lugar. Além disso, os índios se mostram sempre interessados em ouvir o que Altheman tem para contar. Ali todosse ouvem. Que diferença faria se toda a humanidade seguisse essa linha!

Mas a sábia tolerância dos índios não os fazem ingênuos, pois eles são também fortes e perspicazes. Os yawanawás contam para o autor sobre o período em que os missionários chegaram na tribo. Acolhidos com respeito e hospitalidade, os missionários mostraram claramente se sentirem superior aos índios tanto por causa de sua crença monoteísta, quanto pelo seu acesso à medicina “alopática”. Utilizaram os remédios “dos brancos” como forma de manipular e controlar toda a tribo, tornando-a dependente dos mesmos. Mas os índios perceberam a manipulação e expulsaram os missionários de lá nos anos 80.

Enfim, o livro de Leandro Altheman são viagens a diferentes mundos de um mesmo universo: com ele conhecemos o mundo da floresta amazônica, admiramos e ouvimos as revoadas e os cantos dos pássaros, as vocalizações dos macacos, o movimento dos peixes e das águas do rio Gregório, o mundo misterioso das serpentes; com ele conhecemos mundos invisíveis, oníricos, cheios de cores, símbolos, mensagens, enigmas, sensações, paisagens e seres emblemáticos; com ele conhecemos um pouco do mundo indígena, um pouco dos seus ritmos e cantos, da sua dança, do seu artesanato, das suas relações familiares e sociais, da sua relação com os elementos naturais que lhes rodeiam; e, finalmente, viajamos com ele no mundo do auto-conhecimento, pois enquanto ele “se pesquisa”, refletimos também sobre nós mesmos e mergulhamos um pouco em nosso interior, em nossos desejos e emoções, em nossa personalidade, em nossa forma de lidar com os outros, com a doença, com a morte, com expectativas, com o amor e claro, com os nossos sonhos, tanto os de toda noite como os de toda a vida.

* Patrícia Flores é atriz e estudou na Universidade de Berna, na Suíça, onde vive atualmente.

O livro Muká... proporcionou seu primeiro contato com a medicina cultural indígena

quinta-feira, 26 de março de 2015

No Rastro da Serpente

Publico com um pouco (15 dias) de atraso o breve relato de minha viagem pelas Rodovias SP-250 e BR-476fazer site, conhecida entre os motociclistas como "Rastro da Serpente".

Os motivos são óbvios: A Rodovia é tão sinuosa que merece o apelido. Por vezes achei-a tão sinuosa quanto o rio Juruá.

Serve como rota alternativa entre São Paulo e Curitiba.

A rota tem início pela rodovia Raposo Tavares em SP, até Sorocaba e Capão Bonito, onde então começa a descida da serra.

A Rodovia é uma das poucas que continua sobre administração direta do governo do estado de S. Paulo. Talvez por esta razão é considerada a pior rodovia paulista.
Apiaí-SP
Uma pena que uma rodovia que dá acesso ao complexo de cavernas do PETAR esteja tão mal cuidada. O estado do asfalto não é nada convidativo.

O que são convidativas, contudo, são as paisagens ao longo da rodovia.

A estrada serpenteia por uma vasta região de mata atlântica  passando por bosques de araucária mas também muita mata tropical, trazendo as surpresas de mudança de vegetação em função a altitude.

A partir de Apiaí, a estrada melhora bastante.

Ribeira-SP
Há uma parte bem alta, exatamente na divisa entre São Paulo e Paraná, onde predominam campos com grande matacões de rocha.

Nem é preciso dizer que o trajeto é bem arriscado, com tráfego razoável de caminhões.

O motociclista irá enfrentar bruscas variações de temperatura em função da altitude e por se tratar de região serrana é muito provável pegar chuva em qualquer época do ano.

Aqui segue um link que pode interessar a motociclistas.

Porthal Rastro da Serpente




quarta-feira, 25 de março de 2015

Os Guerreiros da Arca


O sujeito acorda de um coma. Ao seu lado um velho conhecido lhe conta as novidades.
-  é você dormiu um bocado! Muita coisa se passou…

O que por exemplo?

O Acre que você conheceu, não é mais. O Brasil que você conheceu, não é mais.
 - o que mudou?

Tudo. Você passou dezesseis anos desacordado.
- dezesseis anos?

Sim. E antes que você saia por ai, é bom saber que você talvez seja uma persona non grata.
- por que?

Tente se lembrar de suas ultimas atividades... como jornalista

Lembro-me de estar defendendo o multiculturalismo, a diversidade de expressões religiosas, de pensamento...

- Pode parar por aí... Basta você saber que a sua tese, perdeu...

Como assim?

Não se faça de idiota. Você sabe, aquela tese do valor da diversidade cultural, humana, religiosa, sexual... Bem, ela foi derrotada. 

E quem venceu?

Faça um esforço, você consegue imaginar. Qual o grupo político-religioso que há vinte anos atrás dizia-se arauto da única verdade.

- Os evangélicos?

Na mosca. Ele cresceram muito, e se tornaram muito, mas muito mais fortes do que naquela época. 

Conseguiram formar maioria no congresso, no senado. Elegeram milhares de prefeitos, dezenas de governadores... e o presidente.

Presidente? Quem é o presidente? 

É melhor ir devagar, se não você pode ter um troço. Vou te contar desde o começo.

Você se lembra de Flavio Maluf

-Lembro, o filho do Maluf evolvido em escândalos.

Pois sim, o Maluf , pai e filho estavam finalmente para ir para a cadeia, depois de décadas com a Polícia Federal no seus encalços. Então eles anunciaram publicamente que se sua conversão a uma Igreja Evangélica e fizeram uma gigantesca doação ao canal de TV do pastor. A TV ficou tão rica que conseguiu mudar a opinião publica e tirar os dois da cadeia. Aí o Flavio Maluf, passou a aparecer na TV como ovelha arrependida, fazendo trabalho com os pobres. Tornou-se um fenômeno de mídia. 

Elegeu-se senador com o maior numero de votos. Com o apoio da TV, iniciou-se uma grande campanha de moralização dos costumes e Flavio Maluf despontou como a voz desta “nova geração”.
Uma loucura. Com a possibilidade real de fazer um presidente, os evangélicos tornaram-se uma militância esmagadora, ultrapassando as barreiras partidárias. Fizeram uma composição com os setores mais direitistas da igreja católica e venceram as eleições.
Foi o fim do estado laico. Emendas e mais emendas foram transformando a antes democracia brasileira em uma teocracia gospel.
Mas e os outros setores, a esquerda, o PT?
Houve muito barulho no início, mas o PT já vinha se rendendo aos poucos, e não resistiu.  Setores importantes da esquerda tiveram medo de se contrapor. Mesmo muitos evangélicos também criticaram este movimento, mas não tiveram voz. O país foi engolido pela "Onda". 

Os evangélicos radicais começaram com uma milícia. No início eles atacavam gays, depois passaram a atacar boêmios. Quando ficaram mais ousados, passaram a depredar centros espíritas, candomblés, igrejas do daime... nem mesmo as tradicionais procissões escapavam. Tinham até um nome sugestivo: “Os Guerreiros da Arca”.

Daí você já pode imaginar o que aconteceu. O movimento espalhou-se pelo país. Prisões, perseguições, mudanças constitucionais reduzindo cada vez mais as liberdades. Mudanças no ensino nas escolas, criacionismo e toda cartilha evangélica. O folclore brasileiro foi praticamente banido dos livros escolares.  Ensino obrigatório do hebraico nas escolas.

O que fizeram com as outras religiões?

Nominalmente ainda existe a liberdade de culto. Na prática o que acontece é que existem programas de governo para padronizar a religião. Atende pela alcunha eufemística de: PER - Programa de Esclarecimento Religioso. Os templos, terreiros e centros espíritas são obrigados a receber os membros do PER, normalmente pastores versados em teologia, para desestruturar o pensamento mágico-espiritualista destes grupos.

- E os católicos?

- Em Rio Branco, são tolerados como uma presença incomoda. Em Cruzeiro do Sul, continuam sendo maioria e virou uma espécie de grande gueto católico, mas eles também estão acuados, o governo marca outras festas na mesma data para esvaziar a sua famosa procissão.
- Imagino que a cada ano tenha menos gente.
- Pelo contrário, mais.

Nossa Senhora da Glória ainda é a única manifestação religiosa não-evangélica tolerada no estado.Vai de tudo, espírita, macumbeiro, gay e até ateu.

Bem está na hora de sair, mas lembre-se, bico calado. A mídia não vai noticiar que você saiu do coma, mas vão estar de olho em você e só não vão fazer alarde.
Passamos pelo corredor e cruzamos com duas autoridades fardadas. A farda era a mesma que eu conhecera exceto pelo bracelete com a estrela de Davi.

- Shalom. Disse meu acompanhante quando cruzou por eles
- Shalom respondeu rispidamente, a autoridade.

Do lado de fora um cartaz da Governadora Antônia Lucia, com aquele olhar no horizonte, como se estivesse em estado de contemplação divina. Abaixo, a frase: “O Acre na graça do senhor”.

Logo adiante um cartaz da prefeitura: “Rio Branco é do senhor Jesus, povo de Deus declare isso.”

segunda-feira, 2 de março de 2015

De Cruzeiro do Sul-AC à Jundiaí-SP em Duas Rodas

Moto: Yamaha Lander 250 ano 2011

1ºTrecho : Cruzeiro do Sul-Rio Branco (aprox. 650 km)


A viagem teve início pela BR 364 em Cruzeiro do Sul. Para um viajante que inicia seu trajeto pelo ponto extremo Noroeste do Brasil em direção ao sudeste, a sensação será de que as rodovias melhoram gradativamente a medida em que se aproximam de São Paulo. Para um viajante que vá no sentido oposto, o que é mais provável, a impressão será a inversa, de modo que quando o mesmo alcançar o trecho Rio Branco-Cruzeiro do Sul, irá se deparar com uma rodovia ainda em fase de implantação, com muitos trechos ruins.
Contudo é preciso dizer que a rodovia federal BR-364, no trecho Cruzeiro do Sul-Rio Branco vem melhorando gradativamente ano após ano. Neste ano por exemplo, não me deparei com os desmoronamentos laterais que no ano anterior eram comuns. Há dois trechos consolidados: Juruá-Liberdade e Sena Madureira-Rio Branco, este último completamente refeito. Há dois trechos críticos com risco de derrapagem. Um deles próximo ao rio Gregório (70km de Tarauacá) e outro próximo ao rio Macapá (entre Feijó e o Purus). No restante do trajeto, a rodovia apresenta uma pista bastante irregular, que obriga o condutor a manter uma velocidade compatível com a segurança da via, que no meu caso variava entre 70 e 85 km/h em média.

2º Trecho Rio Branco- Porto Velho (550Km)


A BR 364 segue em bom estado a partir da saída de Rio Branco, piorando consideravelmente a partir da divisa com Rondônia.
Condições da BR no estado de Rondônia


É necessário realizar a travessia do rio Madeira de balsa, o que acrescenta 30 minutos à viagem. A travessia é paga e o pagamento deve ser feito em um guichê, antes de se adentrar à balsa.
Travessia da Balsa do rio Madeira

A partir da travessia, a qualidade da pista melhora sensivelmente. Este foi o trecho danificado pelas alagações do ano de 2014, que isolaram o estado do Acre do restante do país. Ainda não foi totalmente refeito, e há o risco que novas alagações venham a cobrir novamente a pista.
O lago formado pelas hidrelétricas: ameaça constante à BR 364
É possível perceber a marca da linha d’água da última alagação nas árvores ao redor. De pé, no estribo de minha moto, esta marca atingia o meu peito.

3ºTrecho Porto Velho-Vilhena (720km)


A estrada é razoável. O trafego de caminhões é intenso, mas não senti grande perigo.  Há uma boa oferta de serviços mecânicos e peças de reposição ao longo deste trecho, com destaque para os municípios de Ji-Paraná e Ariquemes.
Vilhena é uma cidade "paranaense" na entrada da Amazônia. Possui boa quantidade de lojas, serviços e hospedagem.

4º Trecho Vilhena- Cáceres-MT (540 km)

Floresta em Terra Indígena contrasta com...

A estrada pareceu-me razoável, o tráfego de carretas de soja é intenso, o que exige muita atenção. Desgastei completamente as pastilhas de freio. Ultrapassagens são especialmente arriscadas. A paisagem varia bastante: de extensos plantios de soja, a belas florestas, especialmente nas partes onde se cruzam duas terras indígenas.


Extensos plantios de soja
Cáceres é uma cidade histórica. O clima pantaneiro e o centro histórico às margens do rio Paraguai são bastante agradáveis.

Rio Paraguai, em Cáceres
5º Trecho Cáceres- Cuiabá-Chapada dos Guimarães-MT (280 km)

Centro Geodésico da América do Sul em Cuiabá
Após uma passagem rápida por Cuiabá, dirigi-me à Chapada dos Guimarães
Não é obrigatória a passagem pela Chapada, mas achei que valia a pena e por isso acrescentei mais 120 Km (ida e volta) que separam Cuiabá, da Chapada. Vale muito a pena.

O Mirante no Morro dos Ventos
O que chamou a atenção nesta rodovia estadual foi o tráfego doméstico, predominantemente de carros de passeio, esconde perigos por trás da aparente “inocência”. 

O primeiro acidente que testemunhei foi justamente neste trecho: um carro de passeio, distraído, acabou colidindo com a traseira de outro. O condutor, poderia ter se distraído com as belas paisagens do local. Há também muitas curvas que exigem atenção total e velocidade moderada.

6ºTrecho Cuiabá-Rondonópolis (215 km)

Para mim este foi certamente o trecho mais perigoso e estressante da viagem. A rodovia federal, que por vezes é a mesma BR 364 e por vezes muda de nome para BR 173, está em péssimo estado. As obras de duplicação estão muito atrasadas. O tráfego de caminhões é intenso, pois esta rodovia liga Cuiabá-Campo Grande e Goiânia. Presenciei balanças e postos rodoviários abandonados. Há algumas partes com terceira pista, o que facilita a ultrapassagem de caminhões, mas a rodovia está muito aquém das necessidades de tráfego.
Carreta de Soja tombada

Serra de São Vicente
Um alento é o trecho da BR 364 na Serra de São Vicente. Uma paisagem belíssima em uma rodovia muito boa, mas que ainda assim, exige total atenção do condutor por suas curvas.

7ºTrecho Rondonópolis - Campo Grande-MS (492 km)



A partir de Rondonópolis, a estrada melhora bastante e as obras de duplicação estão mais avançadas. Ao adentrar o estado do Mato Grosso do Sul, a mesma rodovia federal está em melhor estado. As balanças e postos da PRF estão funcionando.

8º Trecho Campo-Grande- Botucatu-SP (764 km)

Eucaliptais: deserto verde 
Há mais de uma opção para sair do estado de Mato Grosso do Sul em direção ao estado de São Paulo. A escolhida foi por Três Lagoas-Andradina. Há também uma rota mais ao sul, que entra no estado de São Paulo via Presidente Epitácio.


Particularmente, achei o trecho bastante esburacado e sem atrativos visuais. Em sua grande parte são eucaliptais quase sem fim, que continuam mesmo dentro do estado de São Paulo.
Atravessei a divisa na represa de Jupiá e a partir da divisa, temos a rodovia estadual Marechal Rondon (SP300) em excelente estado, já com pista duplicada, o que reduz muito o estresse da viagem. Aqui não há mais risco de colisão frontal e nem o deslocamento de ar produzido por caminhões no sentido contrário.  
Via Rondon

O único porém são os excessivos pedágios. Gastei mais de 30 reais no trajeto até Botucatu.
Normalmente evito dirigir à noite, mas como as condições da estrada permitiam, realizei o trajeto Bauru-Botucatu já no escuro.

9º Trecho Botucatu-Jundiaí (194 km)



A partir de Botucatu, é possível se continuar pela Marechal Rondon, ou pela Castelo Branco. A Rondon passa a ser pista simples, mas o trecho é mais bonito, passando por algumas serras.

De Jundiaí, ainda fui mais adiante, passando por Louveira, Itatiba e Bragança Paulista.

Contudo, após ouvir insistentes apelos de amigos parentes que me alertaram sobre os altos índices de acidentes fatais com motos em SP (seis mortos por dia, em média), os assaltos em faróis e disparos gratuitos contra motociclistas na cidade, decidi deixar a moto em uma cidade do interior e assim evitar um risco desnecessário.

Mais viagens:

Para ler mais sobre a viagem de 2009, ao Peru, com uma Yamaha XTZ 125, clique aqui