quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Papai Noel Brasileiro

Leandro Altheman

Já passei por todas as fases sobre o Natal. Não me lembro de algum dia ter fato acreditado no Papai Noel, mas lembro-me de simplesmente me deixar envolver por esta magia este “espírito do natal” que sempre rende aquelas películas açucaradas de sessão da tarde.

Meus natais eram sempre comemorados na casa de meus avós, na baixada santista, litoral de São Paulo. Natais eram sempre sinônimo de muito calor, noites estreladas e aquele maravilhoso cheiro de maresia. Dormíamos com os ventiladores ligados, quase sempre com aquele ardor de quem passou o dia na praia.
Por esta razão, logo comecei a pensar: por que o “nosso” Papai Noel tem que vir sentado naquele trenó, com aquelas roupas polares, quando a primeira coisa que minha avó fazia quando chegava na sua casa na praia era me obrigar a trocar as calças jeans de “paulista”, por confortáveis bermudas e sandálias?
Por que nós, os brasileiros, um povo conhecido por sua criatividade, ainda não “abrasileiramos” o Papai Noel?Ao invés disso, os “Shoping Centers” preferem gastar toneladas de material para criar uma neve artificial. Por que não lhe damos sandálias, camisas regatas, bermudas, para que possa se deslocar mais confortavelmente pelas terras brasileiras enquanto entrega os seus presentes. Infelizmente, algumas coisas ainda são “transplantadas” de uma cultura a outra criando certas “anomalias”.


De certa forma, me senti um pouco realizado ao ver um senhor de barba branca, anunciar num linguajar bem popular, o crescimento de nosso país e o salário mínimo de 510 reais.

No Juruá

Hoje, vivendo no Juruá, pensei em um pequeno roteiro de um curta metragem, tipo sessão da tarde, mas com as cores dos nossos rios, florestas e gentes.

Cena 1

Papai Noel sobrevoa de trenó o Juruá, se encanta com suas lindas florestas. Vê um lindo lago e decide parar para suas renas descansarem.
Um caçador avistas as renas: - Essas “bicha” vão dá uma boa de uma ceia...
Com alguns disparos de espingarda, abate a montaria de Noel. O bom velhinho, desolado se vê numa “pindaíba”. Tira os presentes do saco e dorme dentro dele, ainda assim é ferrado por levas de carapanãs.

Cena 2

Finalmente Papai Noel é resgatado e consegue carona em um bote com motor de rabeta. Depois de contar a sua historia para o piloto da canoa, este conclui: - Este gringo deve ser meio doido. Vir pro Juruá em um carrinho puxado por veados...

Cena 3






Em meio de viagem começa a sentir os efeitos da malária, em poucos dias está magrinho e amarelo. Finalmente chega em sua primeira casa. – Ho, ho, ho, vocês sabem quem chegou ?
Lá dentro respondem, com as mãos em prece: - Irmão José, quanta graça, ainda guardamos até hoje, aquela água que o senhor benzeu. Bem que minha avó dizia que o senhor iria voltar...

Cena 4

Depois de horas explicando que focinho de porco não é tomada, finalmente Papai Noel convence a família de que não é o Irmão José, mas conhece um pouco da historia e da religiosidade tão rica daquelas pessoas tão simples.
Na segunda casa: - ho, ho, ho vocês sabem quem chegou?
Lá de dentro respondem:
-Padrinho Sebastião, quanta honra! Ainda temos aquele daime do último feitio que senhor dirigiu, lá no Mapiá.
Bem, depois dessa, o Papai Noel se detém por mais tempo, tentando se interar das coisas típicas da região e descobre uma riqueza que sequer imaginava. Resolve tomar o Daime e reconhece uma riqueza e um universo mágico além de suas expectativas.

Cena 5

Por último, passa pela aldeia, onde os índios o chamam simplesmente de Shani Ruapá Tshambichá (Bom Velhinho) . Lá ele toma uma rapé e de manhãzinha, um Kambô, que o livra da malária.
Neste momento já não tem mais nada que o caracterize como o Papai Noel, suas roupas de frio já foram deixadas para trás, seu trenó, ficou atolado em algum ramal, as renas, viraram janta na casa de algum ribeirinho. Finalmente chega a hora de ir embora e ele, depois de deixar todos os seus presentes, pega o seu saco vazio e diz:


- Dei muitos presentes, a maioria deles, inúteis, mas volto para o Pólo Norte com uma bagagem maior do que a que deixei. É uma pena que o mundo ainda desconheça esta magia, tão real, que faz as pessoas daqui viverem felizes mesmo em meio a tanta adversidade... Vocês não precisam de nada, nem de neve, nem de presentes de mentirinha, precisam apenas enxergar com mais amor a si próprios e à riqueza de seu próprio universo ao seu redor...
Epílogo
De volta para o Polo Norte, em meio a rota pelos EUA, Noel, magro e com o passaporte carimbado no Brasil, tem problemas no Aeroporto de Nova Iorque, onde é confundido, com Osama Bin Laden. No entanto, um telefonema de Lula para Obama resolve o mal entendido (afinal, ele é o cara!). Noel segue sem maiores problemas para seu repouso no Polo Norte.

Nota do Autor: Os personagens aqui citados, ainda que de forma bem humorada são dignos de todo respeito. O texto é na verdade uma forma de demonstrar que temos perosnalidades reais que assim como "Papai Noel" despertam um sentido de profunda magia em nosso povo.

Críticos :
...É meio açucaradinho mais serve para enxer linguiça na sessão da tarde...

Um comentário:

  1. Gostei da história do papai noel que visitou a região do juruá, desfrutou, mesmo que brevemente as belezas e costumes desse lugar e confundiu as pessoas, que acreditavam que se tratava de algum personagem presente na sua cultura.
    Ah e ainda não tinha visto textos seus com tendência para o lúdico, ficou dahora "uma parte" desse.
    Mas falando em cultura do papai noel/neve/pinheiro tão presente no nosso país, é mesmo lamentável absorvamos e valorizemos tanto tudo isso, afinal não é muito coerente com nossa realidade, além do que contamos com tantos personagens folclóricos que, sei lá, de repente poderiam ser aproveitados de alguma forma... Apenas devaneios...

    Ah, sobre o Irmão José, eu estava pensando em criar um post sobre ele esses dias. Aqui ninguém nunca ouviu falar de tal senhor, o que denota que é um personagem típico da crença do povo do Juruá. Minha avó contou-me várias histórias "sobrenaturais" sobre ele. Parece que a igreja católica não aprova muito a figura.

    Até mais.

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