quarta-feira, 27 de outubro de 2010

A lição política que vem do Amazonas




Leandro Altheman

Para quem está acostumado à velha dicotomia entre Frente Popular e a oposição no Acre (que um dia já se chamou MDA - Movimento Democrático Acreano), certamente se surpreende com a dinâmica totalmente diferente da política amazonense. Afinal é surpreendente ver PMDB, PMN e PCdoB marchando juntos para defender a candidatura de Dilma Roussef do PT. É mais surpreendente ainda saber que este grupo obteve mais sucesso na transferência de votos para Dilma, do que por exemplo, o PT acreano, que apesar de todas as glórias, é obrigado a amargar uma no mínimo estranha derrota para José Serra, enquanto até mesmo a acreana Marina Silva não consegue fazer milagre em casa e não passa do terceiro lugar. Começo a achar que é melhor decifrar esta esfinge antes que ela nos devore.

O primeiro fator que destaco é de ordem social. A existência da Zona Franca de Manaus cria uma classe de trabalhadores industriários capazes de erguer bem alto, mesmo na floresta, a temida foice do socialismo. Operários de fábrica são aguerridos por natureza, e não tão apegados a valores tradicionais, como normalmente o são os trabalhadores rurais. Infelizmente para nós acreanos, a falta de informação ainda faz da zona rural um terreno propício ao boato, à mentira e ao preconceito, o que acaba por determinar o rumo das eleições.

No Acre a economia na zona urbana é eminentemente formada pelo funcionalismo público o que cria uma intrigante dicotomia na política. Enquanto os funcionários públicos empregados pelo governo tendem a defendê-lo por razões pragmáticas (e não ideológicas), aqueles que não estão empregados, tendem a atacá-lo pelas mesmas razões, na esperança de que na mudança, consigam, quem sabe, uma “boquinha” no novo governo. Salvo raras e honrosas excessões, a lealdade acaba sendo para muitos, proporcional ao seu salário. Talvez por esta razão tenho encontrado em Cruzeiro do Sul tantos ex-petistas, que por perderem o seu DAS agora são "Serra desde criancinha".

Portanto a única saída para o Acre é “subverter” a atual ordem social promovendo mesmo a industrialização do Acre.

O outro fator é de ordem política mesmo. Eduardo Braga, Osmar Aziz e Vanessa Grazziotin caminham entre o povo. Nada de novo para políticos em tempo de campanha. Mas o fato é que a campanha deles já terminou. Converso com um ajudante de ordem, espécie de secretrário direto do governador Eduardo Braga. Ele me diz que as pessoas conseguem chegar facilmente até o governador e que o gabinete dispõe de um serviço que faz com que todas as cartas enviadas pelo público sejam respondidas. O secretário fala das obras e ações do governo. Nada de mais, afinal ele é pago para isso. Mas a diferença está no tom de seu entusiasmo. Alguém que realmente acredita naquilo que está fazendo. Mesmo que o político não consiga trazer soluções concretas de imediato para todos os problemas, o povo reconhece quando um político vive na pele estes problemas. É esta mesma filosofia que está fazendo crescer a popularidade do prefeito Wagner Sales em Cruzeiro do Sul. O povo gosta quando alguém sai de seu gabinete e suja os pés na mesma lama que seus filhos atravessam todos os dias para irem à escola. Mesmo que passem mais 4 anos na lama.

Outra coisa é que o velho discurso em que o candidato pede para votar em todos de um único grupo político, por que só assim, “o Acre vai pra frente”, não funciona mais. Como todo remédio em superdosagem se transforma em veneno, este discurso, repetido à exaustão começa a dar munição para que a oposição diga “com toda essa gente e ainda não deram jeito na BR, na produção, na saúde...”. Mas isso ainda não é o pior. Pior é o sentimento do povo que que está sendo coagido a votar sob pena de não ver as obras concluídas. O juruaense é sobretudo opinioso, prefere sair perdendo do que dar a mão a palmatória. Além disso o resultado pífio obtido no Acre pelo governo de maior popularidade de todos os tempos (me refiro ao Lula) parece também ser resultado deste discurso que pode levar a seguinte interpretação: “ eles só ajudam o Acre por causa do PT, não do povo”. Some a tudo isso aquele “lenga-lenga” da Companhia de Selva, que trata ao povo como uma cartilha de analfabetos e você explica por que está tão difícil de fazer a Dilma ganhar no Acre.

Depois de terminarem o jantar oferecido pelo empresariado local, o trio agora concede entrevistas, não sem antes dar a ordem aos Policiais Militares (do Acre) que faziam a escolta de que também se servissem do jantar.

Um gesto pequeno que pode até estar confundindo um neófito em política amazonense, mas qualquer gesto, por menor que seja, pode servir de indicativo para explicar a grande vitória do atual grupo político amazonense e aprovação recordista de Lula e Dilma, do lado de lá da linha Cunha Gomes.


Um comentário:

  1. Leandro, gosto muito de vir aqui porque os textos, seus e os escolhidos por você são sempre esclarecedores, interessantes e têm uma visão sóbria do cenário político social.

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