Muita gente estranhando e até revoltada com o convite feito
ao deputado estadual Denilson Segóvia (PEN) para que o mesmo participasse do
Festival Yawanawá, realizado este mês de outubro na Aldeia Novas Esperança, Rio
Gregório.
A primeira reação é ver no convite um “desrespeito” com os
povos indígenas convidar o deputado que recentemente em um rompante
fundamentalista e anti-indígena acusou a cultura indígena de “atrasada”, condenado
a pedofilia e a embriagues, supostamente presentes nas aldeias (e, na visão do
deputado, aparentemente inexistente nas ruas das cidades acreanas).
O deputado-pastor também atacou a religiosidade indígena,
denominada de forma genérica como “pajelança”.
Bem, quero dizer aos colegas jornalistas e antropólogos que
não compartilho deste ponto de vista.
Conhecendo um pouco da história do povo Yawanawá, vejo que estender o convite ao deputado é mais uma prova da força deste povo, que não teme
preconceitos e sabe lidar muito bem como fundamentalistas como Segóvia.
Os Yawanawá já fizeram o favor, para si e para o mundo, de
botar para correr os missionários protestantes dos EUA que dominaram o povo por
cerca de uma década. Desde então, vêem lutando pelo reavivamento e manutenção
de sua cultura original.
A cerimônia espiritual com a ayahuasca, chamada “pajelança”
fornece os elementos necessários para o resgate e aperfeiçoamento dos cantos,
orações e ideogramas simbólicos (os kenês, utilizados nas pinturas corporais e
em adornos), de uso proibido por décadas pelos missionários.
Mas, vejo muito mais que isso por trás do gesto. Lembre-me
de uma conversa que tive com o antropólogo Terry Aquino.
Dizia ele, enquanto nós os “brancos”, falávamos de “amansar os
brabos”, os índios também adotavam comportamento semelhante. Ou seja, em alguns
casos esta aproximação com os “brancos” foi intencional pela parte dos indígenas.
Para eles estavam também “amansando os brabos”, no caso,
seringalistas e seus empregados que partiam com toda a fúria em busca das árvores-de-leite,
passando por cima de quem estivesse no caminho. Para estes famintos, entregar
um veado abatido, poderia lhes aplacar a ira motivada pelo preconceito e pela
ignorância e iniciar a partir dali, uma história de contato, mais vantajosa aos
indígenas.
Os Yawanawá são prodigiosos nisto, sabem conquistar e cativar
pela simpatia, pela simplicidade e pela autenticidade.
Além disso, seus principais líderes são mestres na arte da
diplomacia. Não é à toa que os Yawanawá hoje possuem aliados ao redor do mundo,
uma aliança que a cada dia torna-se mais forte.
A ignorância do deputado-pastor da “gospelândia” não afeta
em nada estas alianças, pelo contrário, somente as fortalece ainda mais, ao
fazer o mundo conhecer a mentalidade do parlamentar acreano, em nada diferente aqueles
“brabos” chegaram no início do século XX.
Fico imaginando a grande satisfação dos líderes Yawanawá, ao
verem o deputado-pastor entre o público presente, inevitavelmente se encantando
com os cantos, danças, brincadeiras e lutas ensaiadas. Ouvindo a palavra dos “sheni”
(sábios) e dos “shaneihu” (líderes) enquanto queima a fumaça do “sipá” (incenso
natural).
Com sua cultura rica e encantadora, os yawanawá sabem como
ninguém como é que se faz para “amansar os brabos”.
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