sábado, 16 de janeiro de 2010

Autonomia Ontem, Hoje e Sempre (Parte 1)




Leandro Altheman

Em parte (re)motivado pelos textos do meu amigo e dirigente da UJS Francisco Borges,o “Pancho” (prefiro a grafia em castelhano), resolvi escrever um pequeno texto a respeito da tão sonhada e cantada em verso e prosa “autonomia”.
Afinal, os textos corajosos, simples e diretos de Pancho, identificam algo que todos já sabemos: a diferença no tratamento entre os Vales do Acre e do Juruá. Há uma discrepância muito grande, em todos os setores, embora seja necessário dizer, por uma questão de justiça, que muita gente, tanto do lado de cá, quanto do lado de lá, tem se esforçado em mudar este quadro. Por outro lado também tem gente que se esforça em manter o Juruá como uma espécie de “quintal” político de Rio Branco, ou então pior, tentam nos infligir uma espécie de “colonização mental” como se fossemos pobres idiotas que precisam ser “educados” nos seus termos. E tome peia nas eleições. O Povo do Juruá pode não ter a pretensa inteligência de certos enxadristas do jogo político, mas percebe, quase que intuitivamente, quando estão o querendo lhe engabelar. E nada mais ofensivo do que a sensação de que alguém se pretende colocar na posição de um “doutor” que vai lhe ensinar o B-A-Bá.
Quem de fato precisa de instrução são estes senhores da “capital” que teimam em chamar e a tratar o Juruá como “interior”. Demonstram com isso o mais profundo desconhecimento do básico da História do Acre. Afinal, ao contrario do que poderia sugerir a estátua do Marechal (com a bandeira do Acre nas mãos) não veio ninguém de Rio Branco fundar Cruzeiro do Sul. Nossa cidade foi fundada a partir de uma missão do Governo Federal e ao contrario de Rio Branco, um antigo seringal transformado em cidade pelas contingências históricas, Cruzeiro do Sul, já foi fundada como cidade em 1904. Criada para ser a capital do Departamento do Alto Juruá, que existiu durante a primeira fase do Território Federal do Acre.
Também é muito impreciso creditar ao “PT” ou ao governo da Frente Popular, esta discrepância entre os vales, algo que surgiu lá nos primórdios do território.
Por esta razão, fiz uma singela, mas creio, esclarecedora pesquisa em dois livros, que deveriam ser obrigatórios para todos. Um deles é “A presença do Capitão Rego Barros no Alto Juruá”, de Glimedes Regos Barros e o outro é a Conquista do Deserto Ocidental, de Craveiro Costa (ambos podem ser encontrados na Biblioteca Padre Trindade).
Nestes dois livros é possível conhecer e reconhecer os fatos históricos que culminaram em situações que nos assombram até hoje.
O primeiro fato que deve-se conhecer é de que com a assinatura do Tratado de Petrópolis, foi criado o Território Federal do Acre, já com seus três departamentos: Acre, Purus e Juruá, e suas respectivas capitais. A fundação de Cruzeiro do Sul, vem, portanto a cumprir o que determinava o tratado.
A segunda é de que diante da impossibilidade de comunicação entre as três capitais (Sena Madureira no Purus), criou-se a Comissão de Obras Federais, em 1907 para construir uma estrada de rodagem (olha a BR 364 aí, gente!).
A terceira é que na mesma medida em que diminuíam os lucros da borracha, diminuía também o interesse do governo federal em manter uma estrutura de autonomia para os três departamentos. O primeiro golpe na autonomia que o Juruá gozava de fato e de direito no início do século XX veio com o fechamento dos tribunais de Cruzeiro do Sul e de Sena Madureira. O golpe final veio quando o então Presidente da República, Epitácio Pessoa decretou o fim da divisão por departamento, acabando de direito, com uma autonomia que de fato já não existia mais.
E assim, teve início o fenômeno que conhecemos até hoje, tão bem descrito por Craveiro Costa “... Com isso os recursos destinados aos departamentos, concentravam-se na capital, onde lá mesmo se extinguiam.”
Portanto, uma situação que tem início lá no início do século XX e não na atual política do estado. Outro fato que nos faz pensar também é que ainda que a identidade do “Juruá” seja forte, e o desejo de autonomia historicamente amparado, esta identidade particular parece não excluir a identidade de “acreanos” a que cultuam também os juruaenses. Fruto, é claro, de uma organização onde o Departamento do Juruá, incluía-se dentro do Território Federal do Acre.

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