sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Dinheiro: Coisa do Demônio?

Ui! que terrível!

Vamos dizer de outra maneira:

O dinheiro é como um GÊNIO capaz de satisfazer desejos?

Sim, é claro.

Já tenho explanado aqui por diversas vezes que as palavras demônio e gênio são cognatas, tendo sua origem comum na palavra Djin – que originou por sua vez Gênio, Daemon, Dimon e Demônio.

O Djin a princípio representa uma força elemental, telúrica, que pode ser um guardião de uma fonte ou uma potência capaz de cumprir ordens e desejos (o que tte relação direta com as chamadas "fontes do desejo", tão comuns na Europa e Ásia).

O Djin não pode ser classificado como “mau” ou muito menos como a fonte de um mal. Ele é sumariamente amoral e cumpre as ordens de seu senhor.

A noção de um gênio engarrafado que nos chegou de maneira tão bela através de contos como Aladin – (Alá – Senhor, Djin Gênio ou Demônio) é uma maneira simbólica, folclórica de falar sobre estas potências que colocadas sob o jugo da consciência humana são capazes de realizar desejos.

Livros exotéricos tratam da capacidade que tais “demônios” têm de sob, ordem, trazerem prosperidade, riqueza, fortunas, de criarem até mesmo cidades inteiras.

O “demônio” portanto, não é algo intrinsecamente mau, mas uma potência amoral que pode ser colocada à serviço dos mais variados fins. Tal como o dinheiro. E é exatamente o que fazem a maioria das igrejas evangélicas ao colocarem tais potências "sob jugo", especialmente na chamada Teologia da Prosperidade.

A questão que se trata é que este este “demônio” ou, para não suscitar desnecessários preconceitos, “gênio” é também uma força semiconsciente, ou seja, possui vontade própria. O engenho humano consiste em fazer com que esta força seja canalizada para os devidos fins.

Dinheiro (ou seria Djinnheiro?)

Vou citar aqui um pequeno trecho do discurso de Francisco D'Anconia , personagem do livro

A Revolta do Atlas, de Ayn Hand

"Então o senhor acha que o dinheiro é a origem de todo o mal? [...]

Ele é um instrumento de troca, que só pod
e existir quando há bens produzidos e homens capazes de produzí-los [...]

O dinheiro permite que você obtenha em troca dos seus produtos e de seu trabalho aquilo que seus produtos e seu trabalho valem para os homens que o adquirem, nada mais do que isso [...]

é preciso oferecer valores, não dores [...] o vínculo comum entre os homens não é a troca de sofrimento, mas a troca de bens. O dinheiro exige que o senhor venda não a sua fraqueza à estupidez humana, mas o seu talento à razão humana [...]

o dinheiro é só um instrumento [...] ele lhe dá meios de satisfazer seus desejos, mas não lhe cria os desejos.
...
Então o senhor dirá que o dinheiro é mau.

Mau porque ele não substitui o seu amor-próprio? Mau porque ele não permite que o senhor aproveite e goze sua depravação? [...]

O dinheiro é produto da virtude, mas não dá virtude nem redime vícios. Ele não lhe dá o que o senhor não merece, nem em termos materiais nem espirituais [...]
O dinheiro é um meio. Para quem busca conquistá-lo de forma honesta e merecida, como recompensa por aquilo que produziu e por sua competência, que gosta do que faz e sabe o que quer dele - traz liberdade, satisfação e realiza sonhos. Para aqueles que o obtém sem produzir, sem merecer ou que o consideram um fim, o dinheiro será uma lembrança disso e não trará a satisfação que almejavam.
Dinheiro é necessário, muito ou pouco, dependendo do tamanho dos seus objetivos. Obtê-lo, de acordo com o que você produz ou ajuda a produzir, honestamente, com o seu trabalho - é a raiz de todo o desenvolvimento que nossa sociedade alcançou. Não valorizar isso é a raiz de todo o mal.


Em outros termos, a afirmação do dinheiro como uma força amoral capaz de satisfazer os desejos, ou trazer destruição.
***
Na Escola dos Orixás
A escola dos Orixás trata das forças arquetípicas que regem o comportamento humano e universal.

Na grande escola dos Orixás, aprende-se desde cedo a respeitar o Exú.

O Exú, ao contrário do que querem fazer crer os cristãos não é o “diabo” e muito menos o “satanás”.
O Exu é na verdade o regente de todas as trocas que acontecem no planeta. É o mensageiro entre o humano e o divino, e também entre os diferentes aspectos da divindade. Ele não é mau, nem bom ele é uma força amoral, realiza o que lhe pedem.
O Exu é o regente das trocas e do dinheiro.
O regente do trabalho é Ogum.

O regente da riqueza é Oxumaré.
Na escola dos Orixás, aprende-se que cada um, representa um diferente ponto de vista sobre a realidade e aprende-se desde cedo que cada ponto de vista, mesmo quando antagônico em aparência, é intrinsecamente verdadeiro. Aprende-se a lidar com as contradições.

O Ponto de vista do Exú contém verdades insofismáveis.

Como o belo discurso realista e amoral de Francisco D'Ancona.
Mas sabe-se também, que não é possível viver a realidade apenas com um único ponto de vista. A realidade em que vivemos é feita de multiplicidade. Deste modo, uma pessoa que lhe falte dinheiro provavelmente não será plena e realizada, pois lhe faltarão meios para satisfazer suas necessidades. Do mesmo modo, uma pessoa pode ser muito rica e totalmente insatisfeita, infeliz, por que lhe falta, desenvolver outros aspectos de sua personalidade.
É onde entra a diferença entre riqueza e prosperidade.
Oxóssi é o regente da prosperidade.
Ele, o caçador nos ensina de maneira simples e bela que temos que correr atrás de nossa própria caça. Não podemos esperar que ela caia do céu, ou viver sustentado por outros. Mas ensina também que a caça deve ser compartilhada, pois só assim há prosperidade.
***
Capitalismo X Socialismo
Por vezes, me cansa por demais o debate entre Capitalismo X Socialismo. No meu ponto de vista, me parece um debate infrutífero e totalmente distorcido da realidade mais íntima do ser humano.
Valores presentes no sistema capitalista, são valores humanos e qualquer sistema que o tente abolir estará fadado ao fracasso. Como por exemplo, a realização dos talentos individuais (ser "caçador"). Tire esta possibilidade do ser humano e ele tende a se tornar acomodado. É como tolher uma das mais importantes forças do progresso individual, e por conseguinte, coletivo.

Tais valores tão eloquentemente defendidos por Ayn Hand, fazem parte do arquétipo humano do caçador (aquele que vai atrás).
São exatamente a antítese do sistema paternalista, assitencialista e coronelista defendido pelo "perfeito idiota".
O paternalismo, na qual se assenta a força política do atual gestor municipal de Cruzeiro do Sul, pressupõe uma relação de renovada dependência através de "dívidas de favor" (caixões, dentaduras, TFD's, empreguinhos miseráveis, etc).
É sobretudo escravizante, não conduz nem à autonomia individual, e nem muito menos ao progresso coletivo. É tão somente o engessamento das relações em um nível muito próximo ao dos velhos seringais. Ou seja, é o pior exemplo de um capitalismo periférico, baseado na mentira, na usura, na apropriação de direitos.
É sobretudo, uma aposta na incapacidade do ser humano de ser livre e autônomo

***

Como bem disse Francisco D'Ancona, para quem torna fim aquilo que deveria ser meio, não haverá satisfação.
Por esta razão, acredito no valor e na importância do dinheiro (especialmente como justa recompensa pelo trabalho) mas não o bastante para fazer dele um “ismo” em minha vida. Isto equivaleria a torná-lo uma finalidade em si mesmo.
Não me importo e utilizar os meios disponíveis para a realização da minha individualidade, do meu dharma. Mas não farei de minha vida, uma defesa estúpida de um sistema que mostra, diuturnamente, suas falhas e fracassos. Até por que pela máxima do Laissez Faire, o capitalismo não precisa disso: ele mesmo se auto-regula, se auto-protege e se auto-defende.

Poderia dizer a título de provocação que o capitalismo é uma droga, que faz bilhões de viciados correm atrás de fortunas das maneiras mais inimaginadas possíveis a fim de satisfazerem seus desejos, a maioria das vezes contudo, sem sucesso. É o que acontece quando um meio é transformado em um fim em si mesmo.
Pela mesmas razões aqui expostas, não creio que deixar o “livre-mercado” decidir seja a melhor maneira de conduzir o capital. Uma força amoral semi-conciente, precisa de um pulso firme que a conduza. O contrário seria o equivalente a montar em um cavalo e permitir que ele vá para onde quiser. No entanto, um bom condutor jamais irá ignorar os avisos de um cavalo diante de um perigo, mas quem dá ordens, é o condutor.
Certamente o Estado não é o melhor instrumento de condução do capitalismo, mas é o que dispomos no momento. Relegá-lo a um papel secundário perante ao mercado, seria destinar toda a sociedade a um papel de servidão ao instrumento que na verdade, deveria nos servir.
Do mesmo modo, o socialismo contém também elementos e valores que são intrínsecos à humanidade. A necessidade de compartilhar a riqueza a fim de gerar prosperidade não surgiu com Karl Marx, surgiu ainda nas cavernas, quando o ser humano ainda aprendia a falar. Aliás é um valor anterior à própria humanidade, pois está presente mesmo entre os Lobos e os Leões. Caçar e dividir a caça, ganhar o pão e compartilhá-lo são dois lados da mesma moeda, nos ensinam as forças arquetípicas dos Orixás.

Negar a necessidade de compartilhar em favor de um individualismo desmedido conduzirá nossa sociedade ao cadafalso.
***
Este é um tema muito amplo e não se esgota assim facilmente.
Este nada mais é do que um breve ensaio e exposição de idéias que comumente não são compartilhadas.
Além das relações de troca entre os seres humanos, há também a relação de troca com a natureza, pois é dela que sai tudo afinal e ignorá-la no processo de construção da riqueza é outros dos pontos obscuros do atual sistema.
Em ocasião oportuna, tratarei novamente sobre o conceito andino de Ayni ou reciprocidade. Um conceito que não se esgota somente entre as relações humanas, mas também entre os seres humanos e a natureza que o cerca e que permite a vida.
Continuo insistindo que, as tradições antigas têm muito a nos ensinar sobre o mundo em que vivemos, de modo simples e compreensível.

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